Texto: Thaísa Tobias – CRP/08 33156

Existe um mito, uma crença, na qual a parentalidade é vista como algo inerente ao ser humano. Nessa perspectiva, do senso comum, todos nascem destinados a tornarem-se pais e mães, como se fosse algo instintivo, natural, esperado. Como se em cada um existissem habilidades, competências e saberes, armazenados internamente, que esperam o surgimento de um filho, para então despertarem.

Todavia, percebe-se pontos incongruentes nesse tipo de discurso, difundido socialmente, apesar de seu caráter naturalizante e hegemônico, muitas vezes, passam despercebidos. Esse tipo de discurso pode ser motivo de angústia e sofrimento para alguns pais e mães, quando contribui para o silenciamento daqueles que não se sentem assim, tão preparados, completamente preenchidos e em êxtase com gestação ou com as vivências e sentimentos gerados pela parentalidade.

Existe uma romantização da parentalidade, idealizações que podem ser prejudiciais e dificultar ainda mais a relação entre pais e filhos. Percebe-se que a sociedade tende a mostrar apenas a face doce e delicada do tornar-se pai e mãe. Negando, a existência de sentimentos ambivalentes e as adversidades do cotidiano. Dentro de uma perspectiva histórica e social, as experiências, identidades, funções e noções de infância, matrimônio e relações entre pais e filhos, se modificaram ao longo do tempo, atreladas as necessidades sociais, processos de globalização e relações capitais.

As concepções de crianças, família, maternidade e paternidade se transformaram, devido a fatores que foram necessários para o desenvolvimento da sociedade, sua sobrevivência, necessidade de mão de obra e para a manutenção do status quo (ÁRIES, 1981).

Tendo em vista, as perspectivas sociais e históricas supracitadas, se propõe neste momento, uma reflexão sobre a construção da parentalidade, em uma visão psicanalítica. Desta forma não se nasce pai ou mãe, há uma construção na qual o humano pode ou não desejar vir a ser pai ou mãe.

Pensando agora, naqueles que optam por trilhar o caminho da parentalidade, seja de forma consciente e/ou inconsciente, a forma como cada sujeito se relaciona com este fenômeno é subjetividade, considerando a história de vida de cada um. Sendo iniciada logo nos primeiros anos de vida, ainda na fase da infância, estando intrinsicamente atrelada às relações que foram estabelecidas com o núcleo familiar, mais especificamente com os seus pais.

Essas primeiras vivências com o pai e a mãe, poderão impactar fortemente na parentalidade futura (ZORNING, 2010). As figuras maternas e paternas possuem uma função na estruturação psíquica do sujeito, criando imagens as quais este irá relacionar com ações, pensamentos, comportamentos, sentimentos e atitudes parentais. Assim, o indivíduo irá construir os papéis que acredita ser mais congruentes com o pai ou mãe que almeja se tornar.

Dependendo, da forma como essas imagens foram construídas e das disposições psíquicas internas, o indivíduo poderá reproduzir as relações que teve com seu pai e/ou mãe, e estendê-las a sua relação com os filhos. Ou ainda, poderá se construir em forma de oposição a certos comportamentos e ações, quando compreender que é mais
interessante uma adaptação do seu modelo parental (MALDONADO; DICKSTEIN, 2010).

A parentalidade é também uma possibilidade de ressignificação da própria história de vida, das experiências maternas e paternas infantis. Podendo contribuir para o desenvolvimento do sujeito e a elaboração das suas relações familiares primárias, sendo um processo criativo, que abre margem para possibilidades, quando não se restringe a padrões rígidos e estereotipados (ZORNING, 2010).

Portanto, podemos compreender que há uma ligação entre as experiências parentais individuais e as construções históricas e sociais. Sendo assim, para que se compreenda esse fenômeno é importante que tenhamos um olhar mais amplo, que seja capaz de abarcar questões sociais (os processos de subjetivação, marcadores sociais) e aspectos individuais (a subjetividade, história de vida singular), pois é nessa relação entre o sujeito e o mundo que o humano se constrói. Uma vivência dialética entre o mundo interno e externo.

REFERÊNCIAS:

ARIÈS, P. História social da criança e da família. Rio de janeiro: Guanabara, 1981

MALDONADO, M. T.; DICKSTEIN, J. Nós estamos grávidos. São Paulo: Integrare,
2010.
ZORNING, S. M. A. Tornar-se pai, tornar-se mãe: o processo de construção da
parentalidade, 2010.

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