Por Renata Braga Pasini CRP 05/39471

No início da Pandemia, o que mais me chamou a atenção durante os atendimentos clínicos, foi escutar o quanto as mulheres, e principalmente as mães, se queixavam, e viviam, uma sobrecarga; cumulando a escola online dos filhos, os serviços da casa, e seus próprios trabalhos. E logo me veio a pergunta:

– Porque são as mulheres que sofrem tanto com a sobrecarga?

Difícil não pensar em questões de gênero e culturais. 

Estudando a história das famílias, vemos como ao longo do tempo ficou cabendo a mulher a responsabilidade com a casa e os cuidados com os filhos. Isso começou por volta de 1760, no intuito de acabar com a enorme mortalidade infantil da época. A mulher ficou incumbida da higiene da casa e cuidados com os filhos, ganhando uma função importante para época, e um lugar social de destaque, o domínio do ambiente privado, do lar. Assim também ficou marcada a diferença nas funções do homem e da mulher, ele no âmbito público, trazendo o sustento para a família, e ela cuidando da casa e das crianças, no ambiente privado. Devemos lembrar que faz pouco tempo que nós mulheres tivemos direito ao voto no Brasil (em 1932), entre outros direitos, que hoje consideramos básicos. Foram muitas lutas travadas até se chegar a ter direito a propriedade de coisas, o que não cabia a mulher durante algum tempo.

Assim entendemos, como foi valioso para a mulher, naquela época, ganhar o domínio nos cuidados da casa e dos filhos? E essa é a herança histórica que nos estruturou como mulher.

Para enfatizar essa função da mulher, existem ainda fatores biológicos. São as mulheres que gestam e amamentam os filhos. A maternidade faz parte do corpo da mulher, e é um acontecimento também fisiológico do gênero feminino. Durante um tempo no percurso histórico, os homens nem sabiam que faziam parte da fecundação.

Naturalizando essa função como algo inerente e biologicamente ligado ao feminino, os cuidados com os filhos viraram nosso encargo, sendo reforçado pela naturalização do amor materno, e criações culturais como a falácia do “instinto materno”, presente até hoje em nossos dicionários.

Mas o mundo deu muitas voltas, e houveram muitas mudanças sociais, políticas e econômicas. Vieram as guerras, e a mulher passou a ser valorizada também como mão de obra, ganhou lugar no mundo publico, e seu trabalho passou a fazer parte da economia das famílias de hoje.

Em contrapartida, a mudança no mundo privado, doméstico, não veio junto, ou pior, está em processo. Ainda hoje, é possível ouvir sem grandes constrangimentos, pessoas responsabilizando as mães quando algo acontece com a criança. A gestão do lar e dos filhos, ainda é considerada sua obrigação. Mesmo que seja necessário que ela também lute no mercado de trabalho, onde sua própria sobrecarga, diminui o valor da remuneração. Pesquisas recentes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) apontam a diferença entre o salários de homens e mulheres, e muitos justificam isso dizendo que as mulheres cuidam de filhos, e parentes, e faltam mais ao trabalho que os homens. Somos praticamente punidas e desvalorizadas por cuidar.

A psicologia perinatal e da parentalidade nos mostra esses atravessamentos históricos, culturais, e também de gênero e subjetividade na sobrecarga materna. Essa área da psicologia se debruçou sobre o adoecimento materno, e os prejuízos que a sobrecarga trazem à mulher, as crianças e as famílias, no quadro geral de saúde. As mulheres não devem ficar sozinhas com as responsabilidades da casa e dos cuidados com os filhos, e isso, além de tudo é uma questão de saúde, e traz prejuízos ao desenvolvimento infantil, de sujeitos que serão nossos futuros cidadãos.

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Referências:

Ariès, Philippe. História social da criança e da família; tradução Droa Flaksman. Rio de Janeiro, 1986.

Badinter, Elisabeth. B126a Um Amor conquistado: o mito do amor materno; tradução de Waltensir Dutra. — Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

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